A presidente da Associação Patinhas Abandonadas, Narcisa Rodrigues, diz que, além de continuar a haver mais cães abandonados nas férias, o número de animais deixados na rua, sobretudo cadelas com crias, cresceu entre o ano passado e este. 'A crise económica é também muito acentuada no nosso concelho, havendo casos de pobreza extrema, onde algumas superfícies comerciais que em tempos doavam os restos alimentares para os animais estão actualmente a doar esses mesmos restos para algumas pessoas levarem para casa e alimentarem uma família inteira', explica.
Já a presidente da Sociedade Protectora dos Animais (SPA), Gabriela Melo, defende que o abandono dos animais é anterior à crise, não é sazonal e acontece ao longo de todo o ano. 'É possível que haja mais abandonos devido à crise, mas não há dados oficiais nem nenhum estudo porque o Estado ignora o problema', lamenta.
O que esta responsável verifica é que a conjuntura económica do país acentuou a dificuldade de os donos fazerem face às despesas que um animal doméstico implica (ver caixa). 'Como temos consultórios veterinários notamos, isso sim, que as pessoas se coíbem de fazer despesa devido à crise. Deixaram de vacinar os seus bichos e só recorrem a estes serviços em caso de doença dos animais', alerta.
Apesar de a maioria das queixas que ouve ser de donos que não conseguem suportar as despesas, Gabriela Melo também já se apercebeu de que há pessoas que gostariam de adoptar um animal e não o fazem por falta de dinheiro.
Abates todas as semanas
A responsável da SPA admite que tem havido 'um número crescente' de gatos deixados na rua e que recebe 'dezenas de pedidos de ajuda diários, por telefone', entre outros motivos, porque as associações 'estão a abarrotar de animais, debatendo-se com falta de meios financeiros e humanos para dar mais e melhor resposta'.
A associação de Vieira do Minho é um exemplo. Actualmente, naquele abrigo, com capacidade para 30 animais, há 70. Todas as semanas são 'obrigados' a abater alguns.
Gabriela Melo lamenta que o Estado não faça mais para combater o problema: 'Não podemos continuar a abater animais nos canis porque isso não resolve o problema da sobrepopulação e do abandono - o abate não evita os nascimentos em catadupa', diz, defendendo que 'fica mais barato' ao Estado esterilizar do que abater.
A presidente da SPA não tem dúvidas de que 'o combate ao abandono passa pelo controlo da sobrepopulação animal através da esterilização e castração'. Defende que 'só com uma política eficaz de controlo da natalidade' se pode encontrar correspondência entre os animais existentes e os donos em condições de tomar conta deles. 'Mas como podemos pedir às pessoas que paguem cirurgias de 200 euros para estes fins sem qualquer retorno?', questiona, defendendo que estas despesas deviam poder ser deduzidas no IRS.
A maior parte dos animais que vão parar à porta da SPA ou que são recolhidos pelos voluntários são rafeiros de todas as idades, em geral doentes, mas também há, embora sejam casos mais raros, cães de raça, que arranjam novo dono mais depressa.
No canil municipal de Leiria, o Centro de Recolha Oficial, no ano passado entraram 1270 animais, 285 dos quais cadáveres e 746 considerados 'não adoptáveis' por serem idosos ou agressivos ou por estarem doentes. Dos restantes 239, dez foram devolvidos aos donos e 216 doados. O médico veterinário deste centro, Pedro Nogueira, não nota grandes oscilações entre o ano passado e o primeiro semestre deste ano. De acordo com informação disponibilizada por este centro, apesar de a legislação obrigar a que todos os cães nascidos após Junho de 2008 sejam vacinados, identificados electronicamente e licenciados na junta da freguesia, a maioria dos proprietários não cumpre a lei.Quanto custa ter um animal?
Um cão médio, com alimentação, vacinas, desparasitações e custos com clínicas veterinárias, deverá custar entre 600 a 800 euros por ano. As contas são do veterinário Pedro Nogueira. A presidente da Sociedade Protectora dos Animais, Gabriela Melo, diz que até pode custar mais, mas também pode situar-se em apenas dez. Como 'hoje há opções para todas as bolsas em termos de ração, areia e acessórios', tudo depende do animal e do investimento que o dono está disposto a fazer.
O mais oneroso são as despesas médico-veterinárias: 'Há muito que os donos de animais e os voluntários reclamam a dedução destas despesas no IRS, à semelhança da medicina humana. Justifica-se porque é um sector privado caro, sem alternativa pública', diz Gabriela Melo.
Quanto a vacinas, a lei apenas exige a da raiva, 'erradicada do país': 'Aquelas que se destinam a evitar as doenças mais frequentes, que atentam contra a saúde dos animais e, em consequência, a saúde pública, não são obrigatórias. A vacina da raiva é disponibilizada a preços reduzidos nos canis municipais', diz. Se se incluir, porém, as restantes vacinas, o valor será, segundo Pedro Nogueira, de 50 euros por ano.
Acresce ainda a colocação do chip (30 euros) e a esterilização, que custa em média 160 euros. Trimestralmente é necessário desparasitar o animal - cerca de 20 euros por ano. Em média, as rações para cães rondam os 14 euros mensais (cerca de 170 euros/ano), diz a presidente da associação Patinhas Abandonadas, Narcisa Rodrigues. Mas basta escolher uma mais cara para, segundo Pedro Nogueira, o valor disparar para 600 euros/ano (50/mês). A presidente da Associação de Vieira do Minho adianta que, caso as pessoas prefiram comprar um animal em vez de adoptar, o valor pode ir 'de centenas a milhares de euros'.
Os preços dos hotéis para deixar um animal nas férias também dependem da época e da localização. A SPA tem um no Algarve onde a diária, com alimentação, é de dez euros para sócios e 12 para não sócios. Pedro Nogueira nota que outros podem ultrapassar os 20 euros por dia.