Uma das notícias que mais me chamou a atenção neste fim de ano foi o aumento de cães e gatos abandonados por seus donos. De acordo com a matéria na Folha de São Paulo, animais adotados são devolvidos sem grandes justificativas.
Aliás, este não é um fenômeno que ocorre apenas no Brasil, mas há registros semelhantes em Nova York, Paris, e outras cidades, sendo que os animais são simplesmente largados pelas razões mais variadas: férias, mudança de casa, idade dos animais, doenças...
É impossível se compreender como alguém pode de modo tão simples romper uma relação com alguém que os acompanhou na vida por tantos anos.
Não se trata apenas do abandono material, mas abrange o sofrimento do animal que, repentinamente, é privado do afeto que estas relações envolvem. Como julgar a atitude dessas pessoas? E o que fazer diante dessa situação?
Esta semana conversei longamente com Werner Grau, Norma Padilha e Erika Bechara, três dos mais brilhantes juristas brasileiros, acerca do que fazer diante do simples abandono dos animais de estimação e outras situações de maus tratos relatados pela imprensa: o espancamento de um yorkshire em Formosa e o suposto enterro de um filhote de cachorro vivo em Novo Horizonte - São Paulo.
A Constituição brasileira veda expressamente a crueldade aos animais no artigo 225, §1º, VII, sendo que, no decorrer da Assembléia Nacional Constituinte, parte da mídia à época encarou tal inclusão na Constituição com jocosos comentários.
Naquele período '87, 88', o Brasil se viu diante da polêmica 'farra do boi' em Santa Catarina, na qual se colocaram em polos opostos aqueles que defendiam a realização do evento com supostas justificativas antropológicas e culturais e a sociedade que se indignava com a barbárie praticada contra os bois.
Um projeto de lei que proibia a 'farra do boi' foi aprovado na Câmara dos Deputados e posteriormente rejeitado no Senado, até que uma decisão judicial proibiu definitivamente a realização do evento.
No momento tramitam no Parlamento várias iniciativas que tratam dos maus tratos contra os animais, desde a descriminalização em relação aos animais 'domésticos e domesticados' bem como o agravamento das penalidades em algumas das propostas, neste caso vale assinalar os projetos dos deputados Roberto Santiago e Régis de Oliveira.
Ano passado foi criada a Frente Parlamentar em Defesa dos Animais, liderada pelo Deputado Ricado Izar, com objetivo de defender a aprovação de propostas e incentivar políticas públicas de proteção aos animais.
Esta iniciativa conta com mais de 200 parlamentares, o que demonstra que o Congresso Nacional está atento. O que é muito importante, porque muita gente séria tende a desqualificar estes assuntos e as pessoas que os defendem.
O próximo passo será articular o conhecimento e experiência dos juristas e outros operadores do direito com os parlamentares engajados na causa, com o propósito de elaborar uma legislação que efetivamente puna as condutas lesivas aos direitos dos animais.
A tarefa não será trivial. Pode-se equiparar práticas de crueldade física com abandono? Seria o caso de se regulamentar adoção ou compra de animais de modo a esclarecer pedagogicamente, desde logo, as obrigações e deveres dos seus futuros donos?